sábado, 11 de setembro de 2021

A Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres

A fé foi uma das molas propulsoras das ações dos luso-brasileiros que enfrentavam os invasores da Companhia das Índias Ocidentais nas terras e mares do norte do Brasil. 

Os neerlandeses e seus aliados procuravam impor a religião cristã reformada, o Calvinismo, nas conquistas duramente conseguidas no Nordeste brasileiro, inclusive destruindo e saqueando igrejas católicas por todo território.

A intervenção divina foi invocada e constatada pelos combatentes em diversos episódios da chamada Guerra Brasílica, como a batalha do Monte da Tabocas através da Santa Maria e Santo Antão, mas as duas principais ações bélicas da Insurreição Pernambucana estão diretamente ligadas à intervenção divina através de Nossa Senhora dos Prazeres nos Montes Guararapes, 12 km ao sul do Recife, no município de Jaboatão.

Em 1648 a WIC recebe no Recife um reforço de 6 mil homens vindos dos Países Baixos e decide enfrentar os luso-brasileiros num embate que os destruisse por completo. O general Von Schkoppe desloca quase 5 mil combatentes com destino à Muribeca, centro abastecedor das tropas da Insurreição. Os neerlandeses são confrontados pelos pouco mais de 2 mil soldados do mestre de campo general Barreto de Menezes, no dia 19 de abril, causando mil baixas entre mortos e feridos aos mercenários da WIC que fogem de volta ao Recife.

Menos de um ano depois, 19 de fevereiro de 1649, ocorre nova batalha nos Montes Guararapes. Mais uma vitória dos Insurretos que forçam as tropas neerlandesas a uma desorganizada retirada sob encalço dos luso-brasileiros. Os invasores ficam praticamente restritos ao Recife sem mais poder de contra-atacar.

Em 1656, dois anos após a expulsão dos holandeses, é iniciada a construção de uma pequena capela em homenagem à Nossa Senhora dos Prazeres no local das batalhas para lembrar as vitórias obtidas nos Guararapes. Ocupava terras doadas pelo capitão Alexandre de Moura, proprietário do Engenho Guararapes, ao então governador de Pernambuco e mestre de campo general das tropas luso-brasileiras naquelas batalhas, Francisco Barreto de Menezes. Foi confiada aos monges beneditinos de Olinda. O termo guararapes significa em tupi “caminho das guararas”, uma ave.

Vinte anos depois o prédio da capelinha sofre uma ampliação e construção de uma sacristia. Em 1729 são concluídas a capela-mor e os altares laterais. Em 1965 o Estado de Pernambuco paga uma indenização aos monges beneditinos de Olinda e toda área dos Montes Guararapes, inclusive a Igreja de Nossa dos Prazeres é desapropriada. Em 1971 o local torna-se o Parque Histórico Nacional dos Montes Guararapes.

A igreja possui o maior conjunto de azulejos seiscentistas fora de Portugal e imagens barrocas dos séculos XVII e XVIII. É notável também a utilização de pedras cortadas dos arrecifes, principalmente na fachada do prédio.

Abriga, na capela-mor, os restos mortais de André Vidal de Negreiros e João Fernandes Vieira, que foram dos mais destacados líderes da Insurreição Pernambucana para expulsão dos holandeses, na chamada Guerra da Liberdade Divina.

Desde o século XVII é comemorada a vitória sobre os invasores em uma festa de oito dias, a partir do domingo de Páscoa. Essa festividade existe até hoje e é conhecida como Festa da Pitomba.

quarta-feira, 21 de abril de 2021

Relação de Francisco de Brito Freire

Tomou-se a resolução de intentar o Recife, vila de dois mil vizinhos, posta no areal de uma praia tão apertada, que rebatendo as ondas com fortes reparos de madeiros e navios velhos, para acrescentarem o lugar, a alargaram os holandeses, costumados a defenderem a terra contra a violencia do mar, no sitio parecido a este de seus paises. Goza de ceu benigno, saudavel, em altura de oito graus da banda do sul. Ao sul tem a cidade Mauricea mais como bairro apartado que como povoação diferente, por compreender-se no Recife, cabeça do governo e do comercio; distante so enquanto faz caminho ao Rio Beberibe, que vadeia uma hermosa ponte, pela qual (levantando o assento de madeira) passam navios a ancorarem e a dar fundo.

O Beberibe que corre a vila de setentrião ao meio dia, se aparta aqui em dois braços, com um girando em torno de Mauricea a deixa ilha; com outro prosseguindo junto ao Recife, entra ao levante no oceano que o lava por esta parte, onde se estende estreito e dilatado, o recife de pedra que lhe da nome, descobrisse nalguns lugares, noutros quebram neles as aguas, entre o qual e a vila, fica abrigo e surgidouro para muitas embarcações, com barra dificultosa as de alto bordo. So ao norte continua com a terra firme por uma ligua de areia que se alarga menos de quarenta passos do rio ao mar.

 Às grandes comodidades de sitio, igualam as defensas da arte. Dividem-se por todas as partes dezoito fortes guarnecidos de muita artilharia e obrados com perfeição, nos postos mais comuns fora da praça. Ve-se esta coberta de trincheiras, diques, e plataformas ao moderno: torres e casas fabricadas tão curiosamente que mostram bem o vagar de vinte e quatro anos que a edificarão os holandeses, criando a outra patria com casais, familias e judeus moradores.


Parte do documento de 29 de janeiro de 1654 enviado ao Rei D. João IV e redigido pelo Capitão Geral da esquadra da Companhia de Comércio do Brasil que chegou ao Recife em dezembro de 1653 para sitiar a cidade por mar e permitir o assalto final às tropas da WIC.