sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

Arciszewski – Um Polonês no Brasil Holandês

A Nova Holanda e em particular o Recife eram uma verdadeira Babel das Américas. Gente de toda a Europa e África, além dos portugueses, espanhóis e índios andavam pela Mauritsstad em busca da riqueza do açúcar e pau-brasil, ou nas fileiras do exército e escritórios da Companhia das Índias Ocidentais.

Integrando o quadro de oficiais da WIC, chegou à Pernambuco em 1630, junto com a força de invasão, o nobre polonês Krzysztof Arciszewski, nascido na cidade de Rogalin em 6 de dezembro de 1592. Ele havia sido banido do seu país chegando à Holanda em março de 1624 após ter matado um advogado que extorquia sua família na Polônia. Ingressando no exército das Províncias Unidas em agosto do mesmo ano, durante cinco anos participou de diversas batalhas contra as tropas espanholas e seus aliados na Europa. 

Arciszewski chegou ao Brasil com a patente de capitão, juntamente com outro oficial da mesma patente, o alemão Sigmund von Schkoppe. O polonês toma parte em diversas importantes batalhas como a conquista da Ilha de Itamaracá. Em 1633 retorna à Europa após o final do seu contrato de três anos com a WIC, já no posto de sargento-mor (major).

Em 9 de agosto de 1634 o nobre polonês volta ao Brasil Holandês, agora como coronel do Conselho Militar da WIC na conquista. Sem concordar com a nomeação de Arciszewski, o coronel Sigmund von Schkoppe pede seu desligamento do exército neerlandês e sua volta para a Europa. Os conselheiros da Companhia das Índias Ocidentais no Recife o convencem a permanecer devido à sua experiência na guerra brasílica, dividindo o comando com o coronel polonês. Neste mesmo ano Arciszewski participa de combates no interior da Paraíba e Rio Grande, conquistando os fortes da foz do Rio Paraíba em dezembro, após um mês de duros combates com as forças luso-brasileiras, tomando inclusive a vila de Filipéia de Nossa Senhora das Neves, atual João Pessoa, que passa a ser denominada Frederikstadt em homenagem ao Príncipe de Orange, Frederik Hendrik.

Arciszewski redige o acordo de rendição dos moradores da Paraíba garantindo inclusive a liberdade de religião, baseado no Regimento do Governo das Praças Conquistadas ou que Forem Conquistadas nas Índias Ocidentais, documento com 69 artigos aprovado pelo Conselho dos XIX da WIC.

As tropas comandadas por Krzysztof Arciszewski seguem então para Pernambuco para conquistar o maior bastião português que ainda resistia aos invasores neerlandeses, o Arraial do Bom Jesus, que havia sido construído por determinação de Matias de Albuquerque logo após a invasão, no atual bairro de Casa Amarela, Recife.

O Arraial ou Forte Real do Bom Jesus já estava sob cerco dos mercenários da WIC desde abril de 1635. O cerco vai ficando cada vez mais apertado até que as tropas de Arciszewski rendem os defensores do forte em 08 de junho. No Arraial não havia mais nenhum alimento nem munição, tendo sido consumidos até os animais domésticos e ratos. Ao ser recebida na Holanda a notícia da conquista do forte, a WIC manda cunhar uma medalha comemorativa com a efígie do coronel Arciszewski e uma vista do Arraial.

O próximo passo dos neerlandeses é apoderarem-se do sul da capitania de Pernambuco. Arciszewski leva seus homens para o Cabo de Santo Agostinho, Ipojuca e daí para Vila Formosa, hoje Sirinhaém. Próximo de Barra Grande, litoral norte de Alagoas, as tropas de Arciszewski se encontram com as de Von Schkoppe. Todo o efetivo da WIC na região está em perseguição a uma coluna de oito mil pessoas comandada por Matias de Albuquerque com retirantes do Bom Jesus e de todo sul pernambucano com destino à Bahia.

Passando por Porto Calvo as tropas neerlandesas seguem em direção ao sul de Alagoas. Enquanto isso, uma esquadra luso-espanhola de D. Rodrigo Lobo e D. Lope de Hoces y Córdoba, com 30 navios e 1.700 soldados sob comando do mestre de campo general espanhol D. Luiz de Rojas y Borjas aparece no litoral do Recife e segue para o sul, ancorando em Ponta de Jaraguá, onde hoje se situa o porto de Maceió. D. Rojas y Borjas vem substituir Matias de Albuquerque como comandante do exército luso-brasileiro.

Os homens de Rojas y Borjas seguem para Porto Calvo, assim como as tropas da WIC ao saberem das manobras inimigas. Os exércitos se enfrentam a cinco quilômetros ao sul de Porto Calvo em Mata Redonda. Após dois dias de ferozes combates as tropas de Borjas fogem para Porto Calvo, tendo o mestre de campo general sido morto na batalha.

Em janeiro de 1637 chega ao Recife, Maurício, o Conde Nassau, na condição de Governador e Capitão Geral de Terra e Mar. Depois de poucos dias, Nassau decide atacar as forças luso-brasileiras então alojadas em Porto Calvo sob o comando do general napolitano Giovanni Vicenzo de Sanfelice, Conde de Bagnuolo. Nassau e Von Schkoppe seguem com suas tropas por terra, enquanto Arciszewski leva seu efetivo por mar.

Dia 18 de fevereiro tem início a batalha pela posse de Porto Calvo. Não suportando o assédio neerlandês o Conde de Bagnuolo decide seguir para Alagoa do Sul com pequena tropa e os moradores locais. Em 07 de março os defensores do forte de Porto Calvo se rendem às tropas do Conde de Nassau.

Insatisfeito com a chegada de Maurício de Nassau como comandante supremo no Brasil, Krzysztof Arciszewski retorna à Europa, deixando um relatório denominado Memórias, sobre seus feitos militares e a administração da Nova Holanda. Ao chegar na Holanda ele também entrega uma cópia dessas Memórias aos Estados Gerais em Haia.

Arciszewski sempre enviou relatórios e solicitações para a Holanda cobrando, tanto da Companhia das Índias Ocidentais como dos Estados Gerais, meios para que se mantivessem e se ampliassem as conquistas neerlandesas no Brasil. Alertava sobre o péssimo gerenciamento dos depósitos de alimentos, armas e munições o que provocava a falta desses suprimentos. Reclamava principalmente da lentidão nas decisões do Conselho Político do Recife e na ganância pessoal dos dirigentes da WIC no Brasil. Para ele a solução seria nomear um comandante supremo, com experiência militar e política.

Em dezembro de 1638 a WIC envia da Holanda uma flotilha de sete navios com 1.200 homens sob o comando de Krzysztof Arciszewski no posto de general de artilharia. A expedição chega ao Recife em 20 de março de 1639 e aí começam os atritos entre o polonês e o Conde de Nassau.

Sem reconhecer a autoridade de Arciszewski, Nassau dissolve a tropa recém-chegada, distribuindo seu efetivo entre o contingente local. Nassau também toma conhecimento de uma carta que o polaco intencionava mandar para o burgomestre de Amsterdam, Albert Koenraats van der Borg, com várias denúncias sobre a administração de Nassau. Este convoca o Alto Conselho para que decidam sobre quem ficaria no comando: ele ou Arciszewski. O Conselho manda o polonês de volta para a Holanda, de onde ele não mais voltaria ao Brasil holandês.

Em agosto Arciszewski entrega um documento aos Estados Gerais denominado Apologie onde contesta as acusações que lhe foram imputadas pelo Alto e Secreto Conselho do Recife. Ele permaneceria na Holanda até 1646 quando partiu para a Polônia, onde viveu até sua morte em 1656 na cidade de Gdansk. 

Foi uma das mais importantes figuras do Brasil holandês, apesar de pouco conhecido na história daquele período.

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